Saia lápis cor-de-rosa

sexta-feira, agosto 16, 2013

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13 comentários

  1. Oie! Gostaria de tirar uma dúvida: qual o critério da modéstia? como diferenciar roupas modestas das não-modestas? obrigada

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  2. Ane,

    Obrigada pela pergunta e pela confiança.

    Respondo-te com trechos do livro que estou escrevendo:

    "Jesus mesmo no diz: “O homem bom tira coisas boas do bom tesouro do seu coração, e o homem mau tira coisas más do seu mau tesouro, porque a boca fala daquilo de que o coração está cheio.” (Lc 6,45) O exterior, pois, deve ser reflexo do interior, e não nos adianta nada cultivar apenas o interior, desdenhando do exterior. O homem é alma unida a um corpo. Claro que a alma é mais importante, claro que esta é a forma, claro que ela é que nos garante a semelhança com Deus, e dela procedem os afetos e as intelecções. Não olvidemos, todavia, que embora menos importante, o corpo é também criação de Deus. Negar isso é cair na gnose, é achar que o corpo é maldito, é ruim. O corpo precisa submeter-se à alma, mas não ser negado ou extinto. Até mesmo o Credo que rezamos em todas as Missas diz que no fim do mundo haverá a ressurreição da carne: não é só a alma que será salva, o corpo também. O homem ressuscitado unirá sua alma salva ao corpo tornado glorioso. A busca da santidade, questão profundamente interior, deve se manifestar no exterior, mormente em nossas vestes, que passam sempre uma mensagem aos outros.

    A moda “periguete” ou “biscate” é reflexo de uma crise gravíssima na identidade feminina, um fruto do feminismo, que tanto combateu pelos direitos da mulher e que gerou, paradoxal mas necessariamente, a vulgarização da mulher por conta de um mal compreendido exercício desses mesmos direitos. Também é manifestação da imagem que a mulher tem de si mesmo, como se o atraente fosse a exposição desmedida de seu corpo. Como li em algum lugar, para algumas não basta ser graciosamente sexy, pois o objetivo é parecer modelo de capa de revista de gosto duvidoso ou madrinha de bateria em ensaio de escola de samba.

    O grande São Paulo da Cruz, em carta de 9 de março de 1760, adverte à sua dirigida Teresa Palozzi para que “guarde todos os seus sentidos, em especial os olhos, e também seu coração. Seja modestíssima e guarde a maior compostura de noite e de dia em todos os seus gestos. Deves amar e guardar a virtude da modéstia com o máximo zelo; não se fie em nada e, sobretudo, desconfie de si mesma.”

    “Você pode ter o que quiser se você se veste para isso.” (Edith Head)

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  3. CONT.

    “Uma mulher bonita não é aquela de quem se elogiam as pernas ou os braços”, pontificou o célebre Sêneca, jurista romano nascido em 4 a.C, “mas aquela cuja inteira aparência é de tal beleza que não deixa possibilidades para admirar as partes isoladas.”

    (...)

    “[N]ão se proíbe às mulheres um ornato moderado”, diz Santo Tomás, “mas o excessivo, desavergonhado e impudico.” (S. Th., II-II, q. 169, a. 2)

    (...)

    Ensina Santo Tomás que “as mulheres podem adornar-se licitamente para conservar a elegância de seu estado, e inclusive acrescentar algo para agradar a seus maridos.” (S. Th., II-II, q. 169, a. 2)

    (...)

    “Não só no esplendor e na pompa corporal, senão nos vestidos mais vis e degradantes, se pode buscar vaidade.” (Santo Agostinho, De Serm. Dom. in Monte)

    (...)

    “Não quisera que te precipitasses em emitir juízo de condenação obre o uso de adornos de ouro e vestidos, a não ser contra aqueles que, não estando casados nem desejando fazê-lo, têm obrigação de pensar em agradar a Deus.” (Santo Agostinho, Ep. ad Possidium) Ou seja, é virtuoso que a esposa se arrume com elegância e se enfeite para agradar o marido, ou que outra, solteira, mas que deseja casar-se, também se arrume e se enfeite a fim justamente de conseguir o sacramento matrimonial.

    CONTINUA

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  4. CONT.

    Atenção ao que você veste: a mensagem de suas roupas

    (...)

    Os americanos têm uma expressão que considero ideal para uma das mensagens que devemos mandar, como damas, ao nos vestir: dress to impress.

    (...)

    “Não ande por ai mandando mensagens de que seu corpo é a melhor parte de você - implicando que seu coração, seus pensamentos e sua alma não sejam importantes. Ao invés disso, desperte com a sua modéstia, o desejo de conhecerem-na melhor.” (Crystalina Evert)

    (...)

    A atriz que interpretou Hermione em “Harry Potter” já se perguntava: “O que há de sexy em dizer ‘eu estou aqui com meus seios para fora e uma saia curta, dê uma olhada em tudo o que tenho’?” (Emma Watson)

    Atentemos à mensagem que nossas roupas passam. É importante que não sejamos desleixadas, isto é, que sejamos elegantes. Mas é ainda mais importante que não sejamos imodestas, isto é, que observemos o pudor. Um texto de Sheila Morataya-Fleishman nos fará refletir:

    “A mulher elegante tem, sobretudo, pudor. O pudor é a tendência natural à reserva daquilo que é íntimo. Onde há intimidade brota o pudor.

    A intimidade, por si mesmo se recata, se reserva, se oculta em seu próprio mistério, consciente do alto valor que possui. Porque estou convencida disso como mulher, é que, sim, me importa a largura que têm minhas roupas, a forma em que desnudo ou cubro meus ombros, e o detalhe ao usar uma veste que não fique de maneira excessivamente justa nas formas do meu corpo.

    Por isso é que, na hora de ir em busca de um estilo pessoal, o qual só pode se manifestar com o tempo, é importante que nos perguntemos: em que creio? Que relação há entre o que creio e o que visto? Existe coerência entre o que digo e dou a entender na hora de vestir-me? Se pela primeira vez se apresentar, inesperadamente, diante de mim uma pessoa que admiro, me sentiria orgulhosa da impressão que lhe dei?” (La presencia que encanta)

    (...)

    À mulher graciosa e fiel se lhe pedem duas coisas na atenção ao que veste: que esteja elegante e que esteja modesta. É possível estar elegante, mas imodesta, como brega, porém modesta. E também se pode estar brega (ou inadequadamente vestida para a ocasião) e imodesta: e a combinação dessas duas coisas torna a mulher vulgar. Somos chamadas, todavia, como leigas no mundo, geralmente casadas ou em busca de matrimônio, a combinar não a breguice com a imodéstia, nem a atentar apenas para a elegância ou só para a modéstia. Nosso desafio é a elegância modesta, o estilo com o pudor, a moda com o recato. E nossas roupas vão dizer, inexoravelmente, o que e quem somos.

    A mulher católica é chamada a mostrar ao mundo todo que a virtude do pudor não é desculpa para andar desleixada. Modéstia não é dessaranjo nas vestimentas. É possível conciliar a modéstia com a elegância, o pudor com a beleza dos trajes, ser casta e atraente. Se der mais trabalho, isso lhe será ocasião de exercitar a disciplina e a mortificação.

    (...)

    Estar bem vestida é até mesmo uma forma de polidez.

    CONTINUA

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  5. CONT.

    Devemos, as católicas, ser discretas, mas não sem graça. “Alguns infelizes impulsos Jansenistas ou Puritanos na imaginação Católica moderna têm equiparado modéstia a esconder a figura feminina. Aparentemente, muitas mulheres católicas pensam estar sendo modestas vestindo roupas não atraentes.” (Regina Schmiedicke)

    (...)

    Não é preciso ser rica ou da classe média alta para ser elegante. A leitura de tudo o que foi escrito até aqui nesse livro já deve ter deixado isso bem claro. Sem embargo, não custa frisar. A conhecida por sua elegância e estilo, Olivia Palermo, é quem confirma: “Não é sobre o preço, é sobre as roupas.”

    E um famoso estilista também diz: “Não existe uma chave! Se houvesse, seria muito fácil, as mulheres ricas podiam comprar a chave e todas as preocupações a sua moda seria mais! Mas a simplicidade, higiene e bom gosto - os três fundamentos da moda - não pode ser comprado. Mas eles podem ser aprendidas, por ricos e pobres.” (Christian Dior) Não basta, pois, ter dinheiro, para ser elegante, e, por outro lado, a elegância, se aprendidos seus princípios, pode ser adquirida por todas as pessoas, de qualquer condição social, cultural e econômica.

    Clara é a distinção a seguir: “A moda pode ser comprada. O estilo deve ser possuído.” (Edna W. Chase)

    Aliás, se fosse só questão de dinheiro, bastava tê-lo em abundância para ser chique. Todavia, ter boas condições financeiras, desacompanhada de uma boa formação, pode ser catastrófico. “Dinheiro na mão de gente sem noção de civilidade é uma arma tão perigosa como qualquer revolver na mão de bandidos.” (Glória Kalil)
    (...)

    Não estou sugerindo comprar só roupas caras. Conheçamos a tendência, o estilo, e podemos procurar algo parecido e mais barato, caso não tenhamos dinheiro para uma Carolina Herrera ou outra grife.

    ---

    Trato depois no livro - mas ainda não desenvolvi, só fiz uns rabiscos - do que Santo Tomás ensina (S. Th., II-II, art. 54ss e Suma Teológica em forma de Catecismo) e os vícios contrários de cada um dos subtipos de modéstia, baseado em um vídeo do Pe. Paulo Ricardo: por excesso ou por defeito/falta.

    http://padrepauloricardo.org/episodios/modestia-como-as-mulheres-devem-se-portar-parte-1

    - Modéstia em geral
    - Humildade
    - Estudiosidade
    - Modéstia exterior ou corporal (não é a roupa, mas a gestualidade, a atitude do corpo, o jeito de se comportar, é moderar os movimentos do corpo etc) – vício contrário por excesso é o teatralismo, ser afetado, artificial, caricatural, e vício contrário por defeito é a rudeza, a falta de elã e de compostura
    -- falar da eutrapelia: não ser bobalhão nem carrancudo
    - Modéstia nos adereços, no vestuário (e que está ligada à castidade e ao pudor, mas também à modéstia em geral e à humildade) – ver lá pelos 18min, 20min e q. 169 da Suma – vícios contrários por excesso: 1) vaidade, vestir-se de forma muito elaborada, pavoneada, fruto do narcisismo, caprichando demais na embalagem a ponto de indicar que, no fundo, não gosta de si mesma; 2) sensualidade, apresentar-se de modo despudorado, achar que o que é bonito é para ser mostrado, não se guardar; 3) zelo exagerado, com preocupação excessiva e desordenada nos detalhes do vestir – vícios contrários por defeito/falta: 1) negligência, não se cuidar, andar despenteada, desmazelada, mal-arrumada, com roupa pouca cuidada; 2) deselegância, andar desalinhada, não ter noção de produzir uma beleza estética honesta em seu vestir, andar como “Maria-mijona” achando que isso é que é a modéstia, que deve ser brega para agradar a Deus; 3) simplicidade por vaidade, falsa humildade, falsa simplicidade, chamar a atenção por ser aparentemente modesto no exterior.

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  6. CONT.

    Voltemos ao meu texto.

    Ensina a Igreja: “A pureza exige o pudor, que, preservando a intimidade da pessoa, exprime a delicadeza da castidade e orienta os olhares e os gestos em conformidade com a dignidade das pessoas e da sua comunhão. Ela liberta do erotismo difuso e afasta de tudo aquilo que favorece a curiosidade mórbida. Requer uma purificação do ambiente social, mediante uma luta constante contra a permissividade dos costumes, que assenta numa concepção errônea da liberdade humana.” (Comp. Cat., 530)

    O pudor consiste “na inata e mais ou menos consciente tendência de cada um a defender da indiscriminada concupiscência das demais pessoas um bem físico próprio, a fim de reservá-lo, com prudente seleção de circunstâncias, aos sábios fins do Criador, por Ele mesmo postos sob o escudo da castidade e da modéstia.” (Pio XII, Discurso em 8 de 11 de 1957, AAS 49, 1957, 1013)

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  7. CONT.

    A origem da palavra “moda” é a mesma do verbete “modéstia”, como nos ensina um Papa de veneranda memória. “Moda e modéstia deveriam caminhar juntas como duas irmãs, porque ambos os vocábulos tem a mesma etimologia; do latim ‘modus’, quer dizer, a reta medida, além e aquém da qual não se pode encontrar o justo.” (Pio XII) Nesse sentido, a moda será, no mais das vezes, neutra, apresentando-se pecaminosa quando configurar ocasião de pecado para si ou para o outro – levando ao pecado contra a castidade, por pensamentos e olhares, por exemplo, o que veremos, na prática, no decorrer do livro.

    Essa ocasião de pecado, então, é algo circunstancial. No período do romantismo, um simples tornozelo era excitante – lembram da “Pata da Gazela”? Assim, os que acusam de imodesta uma saia que seja um dedo abaixo ou acima do joelho, ou uma blusa que não cubra o braço, deixando, pois, de fora, o mesmo tornozelo, seriam acusados, por sua vez, de promover uma moda imodesta para os românticos. Ou seja, os primeiros acusadores, ainda que insistam em uma aplicação absoluta das regras de modéstia, também são circunstanciais. Os românticos olhariam a moda dos que defendem que a saia pode mostrar os tornozelos, mas não os joelhos, como igualmente imodesta. A diferença é apenas o período histórico de que tiram as circunstâncias. Aqueles que pensam que uma saia mostrando o joelho é imodesta estão, na verdade, é sendo circunstanciais, mas olhando para a década de 50, o que é algo que já demonstra certa ideologia em seu pensamento, ao pensar que houve uma “época de ouro”, coincidindo com o pós-guerra. Curiosamente, exaltam essa época como se fosse irretocável até mesmo na observância da liturgia. Querem transportar todo o quadro histórico, que julgam perfeito, em uma nostalgia ideológica. Óbvio que os anos 50 tiveram seus valores, e pessoalmente gosto muito da inspiração que nos chega de seus vestidos, de seus comportamentos, da visão de família ainda tradicional, mas nesta terra de exílio jamais haverá “época de ouro”, e, pois, temos que viver o tempo a fomos destinados por Deus, aplicando a modéstia absoluta às circunstâncias relativas.

    O próprio Pio XII, citado acima, defensor da modéstia e do pudor, não insiste jamais na proibição de calças para mulheres, nem dá regras milimétricas. O Papa fala nos princípios, pois sabe que as situações, os ambientes, a cultura, etc, mudam.

    Insuspeita é a fala de um sacerdote da Fraternidade Sacerdotal São Pio X, fundada por D. Marcel Lefebvre, a respeito d os usos nos vestuário das mulheres por eles atendidas: “A tendência no vestir que se tornou, aos poucos, dominante entre nós refletem a modéstia – que é necessária – mas a modéstia não está limitada às modas Tradicionais. Ao querer impor essas regras de vestimentas, nós desanimamos as pessoas mais do que as atraímos. A conseqüência é um tipo de libertação excessiva destas regras, que as leva à imodéstia. Uma outra conseqüência é um tipo de representação esclerosada da Tradição, que parece viver nos anos 50 – não muito atraente!” (Pe. Guillaume Gaud, FSSPX)

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  8. CONT.

    O Doutor Angélico é claro ao dizer que, embora a moral seja atemporal e absoluta, a condição dos vestidos exteriores será ou não modesta segundo a cultura própria, dado que “o ornato exterior deve corresponder à condição da pessoa segundo o costume comum.” (S. Th., II-II, q. 169, a. 2)

    E São Francisco de Sales, o grande incentivador do apostolado e da vida de piedade dos leigos, diretor de muitas almas, e incansável conquistador de calvinistas na Genebra da qual foi Bispo, ensinava: “[N]o tocante à matéria e à forma dos vestidos, a decência só se pode determinar com relação às circunstâncias do tempo, da época, dos estados ou vocações, da sociedade em que se vive e das ocasiões.” (Filoteia, III, cap. XXV)

    Na visão da Igreja, a moral deve ser pensada por princípios, não por regras de pode e não pode, pois isso é próprio do puritanismo, de matriz gnóstica. Assim que, a cada circunstância, os princípios devem ser invocados, não um recurso a uma lista. E, com base nesses princípios, em coisas contingentes, pode-se ter conclusão distinta.

    Não há uma regra “isso é modesto”, “aquilo é imodesto”. Evidentemente, que há situações que saltam aos olhos quanto ao erro, por afastarem a virtude do pudor. A maioria dos “tomara-que-caia”, a “minissaia”, e certos maiôs, por exemplo, são absolutamente incompatíveis com a modéstia cristã. Outras roupas são imodestas dependendo da situação.

    Não deixemos, outrossim, de valorar o componente cultural e de aceitação social. Não deve ser determinante - uma sociedade em que seja “normal” andar pelado, nem por isso deixará de ferir o pudor. Porém, são fatores a considerar, sim.

    Combatamos pelo pudor, pela modéstia, pela moralidade. Sem nos atermos a um mundo ideal dos anos 50.

    Calças apertadas, “socadas”, por exemplo, são igualmente um atentado ao pudor. Isso não quer dizer que todas as calças femininas tenham que ser como as de palhaço de circo. Claro que as partes pudicas e as nádegas não devem ser mostradas com calças apertadas, e uma roupa por cima dessas partes resolve o problema.

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  9. CONT.

    Não quero me aproximar de um certo tipo de “comunismo das vestimentas”, onde todas as mulheres acabariam tendo não só uma regra para se vestir, como quem sabe para falar, andar, agir e tudo mais.

    Como um sacerdote amigo nosso respondeu ao Rafael, meu esposo, em uma conversa que tiveram dias atrás:

    “Seria tudo mais fácil se tivéssemos tabelas sobre ‘o que se pode ou não usar’, mas, como sabemos, a moral católica não funciona assim.

    Funcionamos com princípios. E, o princípio que poderíamos partir para tentar achar alguma luz para este caso é a própria definição da virtude da modéstia. Santo Tomás a define como ‘virtude que governa nossas ações, gestos e atitudes de modo que, no possível, não demos aos demais - nem a nós mesmos - ocasião de apetências sexuais desordenadas.’”

    Percebem que caminho tendencioso estaremos seguindo? Onde estará o respeito as individualidades de cada um? Há o cinza, amigas. E onde a Igreja não legisla, cabe a nós discernirmos o que é correto, bem como o que cabe para cada ocasião.

    Na S. Th., I-II, q. 7, Santo Tomás trata de esclarecer que as circunstâncias dos atos humanos são também fundamentos da moral. A moralidade é absoluta, mas a aplicação de seus princípios leva em conta aspectos circunstanciais. Isso se aplica, como visto, às roupas.

    Aliás, Santo Agostinho, na Carta 54, diz não poder condenar quem comunga todos os dias e quem se abstém disso e, depois, dá uma longa explicação de como os costumes mudam de lugar para lugar. Continua que, exceto por uma ordem explícita do Papa, não há razão para violar as liberdades dos diferentes povos. Se é costume generalizado, e aceito pela maioria dos bons cristãos, honrados, que buscam a santidade, que comungam com os ensinamentos da Igreja, que a mulher use calça, então esse uso é permitido. Não se trata de democracia para escolher o que é certo ou errado, mas saber que as roupas dependem dos costumes e, associando o que diz Santo Tomás e Santo Agostinho, ele é fonte da moralidade. Os costumes atuais dos cristãos e suas intenções e sensibilidades são elementos que podem mudar a apreciação moral.

    Essa relativização da moda e sua interpretação da virtude do pudor no vestir de acordo com os costumes gerais, pode ter seu exemplo na comparação entre a iconografia – que é um locus theologici – que representa Cristo com os cabelos compridos e a advertência bíblica, da lavra de São Paulo Apóstolo, de que os homens não o deveriam portar. Não é uma contradição entre o Mestre e o discípulo, mas a constatação de que diferentes costumes no trajar geram "regras" diferentes. São Paulo falava a um público no qual os cabelos compridos masculinos soariam imodestos. É um indício claro de que há, nesse terreno, coisas absolutas e relativas. Também o Concílio de Jerusalém proibindo carne sufocada para os pagãos - ou S. Paulo proibindo de comer carne a alguns, enquanto permitia a outros -, podem ajudar a iluminar essas situações onde as circunstâncias jogam papel relevante no juízo moral.

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  10. CONT.

    Quanto a Igreja diz “mulheres devem usar roupas de mulher”, ela não está definindo qual é a roupa de mulher. O que vai definir é a cultura, o ambiente, o caimento da roupa, o tipo de corte, o biótipo da mulher em específico. Isso não é relativismo. Relativismo seria relativizar a expressão “mulheres devem usar roupas de mulher”, pois isso, como uma verdade, é necessariamente absoluta e objetiva. Já o conceito de roupa de mulher não é uma verdade, e é variável. O modernismo, vejam, foi condenado por ser a variabilidade do conceito de cada dogma, mas isso não impede que outras coisas possam variar. Verdades não variam, não se adaptam, mas o conceito de roupa de mulher não é uma verdade. Temos, claro, que sempre usar roupa de mulher, mas o conceito disso pode mudar. Se eu usasse uma calça jeans com corte masculino ou um terno com gravata, igual ao meu marido, algo estaria errado, mas não uma calça ou um terninho com corte feminino: e reconhecemos bem um quando o encontramos, não?

    “Esta é uma das questões particulares [a roupa] nas quais o problema do pudor ou do impudor aparece com mais frequência. Seria difícil discutir agora as nuanças da moda feminina ou masculina enquanto se relacionam com o problema mencionado, o problema do pudor e do impudor certamente se relaciona com a questão da moda, ainda que talvez não da maneira que em geral se supõe... Além disso é inevitável que a roupa destaque o valor do sexo, mas não há razão para que contradiga o pudor. Não há nada de impudico no vestir a não ser aquilo que, ao destacar o sexo, contribui claramente para diminuir o valor essencial da pessoa, provoca inevitavelmente uma reação a respeito da pessoa como se ela fosse só um ‘objeto possível de uso’, por causa do seu sexo, e impede a reação a respeito da pessoa enquanto 'um possível objeto de amor', por causa do seu valor como pessoa.” (João Paulo II. Amor e Responsabilidade)

    A absolutização das vestes, como se mulheres sempre devessem usar saias e vestidos, lhes sendo vetadas as calças, ignora as diferenças regionais e temporais. Nem sempre a mulher - e mulher cristã, mulher modesta, mulher de bons costumes - vestiu a mesma coisa. A modéstia não muda. A aplicação de suas regras às roupas muda, e muda porque mudam as roupas, mudam os costumes, mudam os cortes, mudam até os corpos. Dogmatizar a indumentária tem raízes não só no gnosticismo, mas em um etnocentrismo. A Carta a Diogneto, um dos primeiros documentos do cristianismo, dizia que os cristãos não se distinguiam dos pagãos por suas roupas.

    As túnicas femininas do tempo de Cristo, aliás, mesmo as usadas por judias piedosas e pelas primeiras cristãs, deixavam à mostra o braço inteiro e o pescoço. Não se encaixariam em algumas “regras” que algumas radicais da modéstia pregam.

    Aliás, essas mesmas “regras” das radicais falam, por exemplo, em não se usar vestidos no joelho, e sim um ou dois dedos abaixo dele. Só que essa mesma regra seria considerada imodesta no séc. XIX: apenas vestidos nos tornozelos eram permitidos. Ou seja, as radicais da modéstia atuais, tão ávidas a condenar as cristãs que prezam a modéstia mas usam calças e saias um pouco acima dos joelhos, estariam condenadas pela aplicação anterior da mesma modéstia.

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  11. CONT.

    O fato é que as radicais, ao misturar a modéstia absoluta com a aplicação relativa da mesma (relativa porque se relaciona com o tempo, com o ambiente, com o corpo, enfim, com os costumes, que, como vimos, é fonte da moralidade do comportamento humano), prendem-se ao que os anos 50 consideravam modesto. Isso parece ter origem na idolatria dessa "época de ouro" dos americanos, no pós-guerra. Os Estados Unidos formam o caldo de cultura ideal para o pensamento sectário: puritanismo do modo de pensar - dado que foi fundado por calvinistas puritanos - e glorificação do pós-guerra. Somemos esses dois aspectos e temos as listas de "pode e não pode", oriundas de setores brasileiros que beberam em algumas fontes católicas mais tradicionais norte-americanas.

    Quanto a comparar nossas roupas às que a Santíssima Virgem usaria, teríamos que ter certo cuidado. Primeiro porque ela era consagrada e como tal deve-se diferenciar das demais mulheres, segundo que, basta olharmos as mulheres que eram santas e que se trajavam de forma comum à sua época. E o que nunca faltou à Nossa Amada Mãe foi bom senso e capacidade de se adaptar à realidade que se encontrava, sem nunca perder a caridade e a noção do correto. Depois, é interessante que coloquemos bem claro, em nossa meditação, que temos que imitar, nos santos, a sua virtude, mas não cada comportamento exatamente igual. Do contrário, estaríamos deixando de imitar Nossa Senhora se tivermos relações com nossos maridos, por exemplo.

    C.S. Lewis, o autor das “Crônicas de Nárnia”, que era anglicano, mas não se converteu apenas porque morreu antes, escreveu e não posso deixar de considerar suas palavras, ele que era amigo de Tolkien, e tinha uma grande admiração pelo Papa, uma profunda devoção ao Santíssimo Sacramento, às formas rituais católicas e à Santíssima Virgem, e mesmo raciocinava de um modo bastante tomista:

    “Consideremos agora a moralidade cristã no que diz respeito à questão do sexo, ou seja, o que os cristãos chamam de virtude da castidade. Não se deve confundir a regra cristã da castidade com a regra social da “modéstia”, no sentido de pudor ou decência. A regra social do pudor estipula quais partes do corpo podem ser mostradas e quais assuntos podem ser abordados, e de que forma, de acordo com os costumes de determinado círculo social. Logo, enquanto a regra da castidade é a mesma para todos os cristãos em todas as épocas, a regra do pudor muda. Um moça das ilhas do Pacífico, praticamente nua, e uma dama vitoriana completamente coberta, podem ambas ser igualmente “modestas”, pudicas e descentes de acordo com o padrão da sociedade em que vivem. Ambas, pelo que suas roupas nos dizem, podem ser igualmente castas (ou igualmente devassas). Parte do vocabulário que uma mulher casta usava nos tempos de Shakespeare só seria usado no século XIX por uma mulher completamente desinibida.”

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  12. CONT.

    Os profetas, os doutores da Igreja, os Padres, e todos os santos sempre aconselharam os fiéis a se vestirem com pudor e modéstia. O modo como nos vestimos é um reflexo de nossa vida íntima. O exterior reflete o exterior, diz o adágio. O modo como nos vestimos, nossa aparência, o tipo de vestuário que utilizamos, são como mensagens que enviamos aos outros, dando informações preciosas a nosso respeito: nossas intenções, nossas particularidades, nossas crenças mais profundas, nosso estilo de vida. O recato no vestir é, pois, uma mensagem poderosa que mandamos a todos: somos sérios, consideramos importante a castidade, queremos agradar a Deus, e consideramos que o corpo não deve ficar tão exposto. Não deixa, pois, o jeito de nos vestirmos, de ser um verdadeiro apostolado silencioso, influenciando a todos, e mostrando princípios importantíssimos que informam o ser humano. E se esse recato vai acompanhado da beleza das vestes e da elegância, isso é mais benéfico ainda, pois estamos deixando bem claro que se pode ser modesto, ter pudor, sem parecer uma “Maria-mijona”, pode-se ter recado e amor pela castidade exterior, sem que tenhamos um aspecto “apagado”.

    Evidentemente, não há um código católico de vestimenta. E isso nem seria possível, pois a Igreja trabalha com princípios, não com listas de “pode” e “não pode”. As circunstâncias nos fazem aplicar os princípios do pudor aos casos concretos. Claro que não há aqui qualquer relativismo: a moral é absoluta, o pudor é objetivo. Mas a aplicação desse pudor varia conforme a cultura, o tipo de evento, a combinação entre as roupas, o corpo da mulher que o veste, e até mesmo, a “postura” e o temperamento da pessoa.

    Igualmente evidente, todavia, que algumas roupas são, em geral, imodestas. Shorts muito curtos, minissaias, decotes profundos, blusas que não cobrem a barriga, calças justíssimas sem a devida cobertura, transparências indevidas, não são adequadas à mulher recatada. Não há um código, repetimos, nem uma lista. Mas a aplicação dos princípios à realidade concreta nos diz isso. É uma conclusão inevitável: certas roupas podem ser pudicas ou não conforme as circunstâncias, porém outras na maioria das vezes (ou na totalidade) são imodestas. O melhor critério para esse discernimento é a formação da consciência e a diária pergunta, diante do espelho: “Será que agrado a Deus com essa roupa?”

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  13. CONT.

    Esse tema das vestes se divide em quatro pontos, basicamente: 1) a virtude da modéstia, que é na verdade, em sua origem, o justo conceito de si (i.e., não chamar excessivamente a atenção para si mesmo); 2) a virtude do pudor (não mostrar mais do que se deve, o que depende das circunstâncias, que são variáveis por definição, mantendo coerência do exterior com o interior); 3) a ocasião de pecado (que influencia o ponto anterior e por ele é influenciado, mas ontologicamente dele se distingue);
    4) diferenciação dos sexos nas roupas.

    O que fazem muitos que pregam uma modéstia mais estrita, não diferenciando as circunstâncias e, na prática, apresentando listas fechadas do que pode e do que não pode, com forte cheio de gnose, e demonizando certas peças, e estabelecendo centímetros e milímetros de licitude, é misturar os três primeiros pontos, e eventualmente colocar o quarto.

    A dificuldade, imposta pela modernidade, de pensar por princípios, que devem ser aplicados ao caso concreto, faz com que alguns se tornem obcecados com um padrão. Para combater a imoralidade, que é filha da modernidade, apelam para um modo de pensar que é também moderno, de matriz kantiana, com imperativos categóricos, "pacotes fechados". O modo tradicional do pensar católico, que foi sempre o da Igreja, e é baseado na própria razão, na natureza, é o de usar princípios e aplicá-los à realidade concreta. Mas somos tão sufocados pela modernidade que esse jeito que seria natural de raciocinar se torna pesado, difícil, dá trabalho. A solução culturalmente puritana de adotar um esquema de equações protestantes é bem mais fácil, porque imediata e dispensa a profundidade de análise: se x, então y. Típico da modernidade, algo absolutamente contrário ao modo católico de enfrentar os problemas.

    Como diz um amigo, Juliano Cizotti, estão como que hipostatizando a modéstia, o pudor, numa configuração fechada e inviolável, absoluta e independente. Acham que Pio XII os está corroborando quando afirma que a modéstia é imutável. Ora, todas as virtudes o são, mas, paa ficar no exemplo do mesmo Juliano, evitar atirar nos inimigos quando se está em guerra não é coragem, o que seria se fosse em outra ocasião, em outras circunstâncias, como quando o inimigo está desarmado e pode ser rendido sem isso. É quase o mesmo fetiche que alguns possuem com a literalidade absoluta da Quo Primum.

    Enfim, é bom perceber que nem toda roupa imodesta é esteticamente feia, e nem toda roupa modesta é sempre bela e elegante. É possível, assim, ser imodesta e brega, imodesta mas esteticamente bonita e na moda, bem como modesta e brega, e modesta com elegância. No conflito entre a modéstia e a imodéstia, deve aquela sempre prevalecer, ainda que a custas de parecer brega, embora o ideal seja a busca de conjugar a modéstia com o vestir contemporâneo: noutros termos, ser recatada mas na moda, preservar o pudor porém mantendo a elegância.

    “Seus vestidos devem ser justos o suficiente para mostrar que você é mulher, e soltos o suficiente para mostrar que você é uma dama.” (Edith Head)

    Espero que o longo texto te ajude.

    Aline

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