Uma moda que não passa: a beleza interior

quarta-feira, novembro 25, 2009

Por Interprensa/Ed. Quadrante
Hoje em dia vemos rostos com sorrisos artificiais, operações cirúrgicas para evitar as rugas, lipoaspiração, injeções de silicone para modelar corpos que não têm outro defeito a não ser o desgaste natural provocado pelo tempo. Venderam-nos uma imagem de mulher que valoriza a aparência, mas se esquece "dela", da mulher como pessoa.
Na obra "Marianela", de Perez Galdós, a protagonista pergunta ao cego a quem serve de guia se ele sabe distinguir o dia da noite. O cego responde: "É dia quando você e eu estamos juntos; é noite quando nos separamos".

Marianela é uma jovem deformada por um acidente sofrido quando pequena. Somente seu amigo cego podia ver a beleza de seu interior sem se ater à superficialidade do seu corpo deformado. A cegueira dos olhos físicos era o princípio de luz de seus olhos interiores para ver os outros. Não julgava pela impressão sensível. Julgava pela beleza segundo a estatura moral da pessoa.

Interessante forma de apreciar o mundo. Uma lição serena para uma sociedade ocidental tão angustiada pelo cuidado estético e, paradoxalmente, tão superficial no cultivo da interioridade. A beleza continua a ser uma enorme preocupação feminina. Mas, o que é realmente belo?


APROXIMAÇÕES DO CONCEITO

No século V a.C, os sofistas definem a beleza como "o que era agradável à vista ou ao ouvido". Com essa definição, a "beleza" começa a distinguir-se do "bom". Mais tarde, os estóicos propõem uma nova definição: "aquilo que possui uma proporção apropriada ou uma cor atrativa". Aristóteles define a beleza como "aquilo que, além de bom, é agradável".

Como vemos, enquanto os sofistas privilegiam o atrativo sensível que provoca o objeto belo, os estóicos ressaltam o equilíbrio interno entre as partes do objeto. Aristóteles, por sua vez, assume uma postura intermediária que concilia ambas as teorias.

Junto a estas tentativas de definir a beleza, a Antigüidade agregava outros elementos, tais como a proporção, o ordenamento das partes e as inter-relações que se estabeleciam entre elas. A esta proporção, cujo fundamento está inscrito na mesma natureza e cujo paradigma máximo é o corpo humano, dá-se o nome de "simetria".

Retomando a idéia de "iluminação" como parte substancial da beleza, São Tomás de Aquino fala da beleza como "esplendor da forma". Sempre houve uma associação natural entre bondade e beleza.


VARIÁVEL COMO A MODA

Apesar disso, o conceito de beleza muda segundo as culturas e os tempos. Na antiga literatura chinesa, o conceito de "mulher bela" se refere a um ser delgado e frágil. Em um país como o Japão, a definição de beleza também parece ter variado segundo a época. As mulheres bonitas que foram representadas em impressões em madeira durante o período Edo, tinham uns rostos compridos, olhos largos e bochechas grandes e proeminentes. Não obstante, no período posterior à Segunda Guerra Mundial, as mulheres de aparência masculina passaram, de repente, a ser consideradas atrativas. Isto falando brevemente da beleza de traço oriental. Nem sequer podemos compará-la aos moldes ocidentais do século XXI, no qual a mulher pálida...

Como é possível haver estandartes de beleza feminina tão diferentes na sociedade?

As mulheres têm a tendência a cair na armadilha que as faz querer se encaixar no molde de "beleza" estabelecido pelas tendências sociais de cada época. O propósito desta interminável busca, e o objeto ao qual se busca, costumam ser esquecidos. Que beleza se busca? A do parecer ou a do ser? Para quem essa beleza é conquistada: para quem a adquire ou para os outros?


DIFÍCIL ESQUECER A APARÊNCIA

Hoje em dia vemos rostos com sorrisos artificiais, operações cirúrgicas para evitar as rugas, lipoaspiração, injeções de silicone para modelar corpos que não têm outro defeito a não ser o desgaste natural provocado pelo tempo. Venderam-nos uma imagem de mulher que valoriza a aparência, mas se esquece "dela", da mulher como pessoa. À força de ver modelos esbeltas, sem nenhum defeito externo e com medidas impossíveis, aceitamos que o ideal de beleza que nos permite entrar pela porta grande do mundo é semelhante ao da Miss Universo coroada no concurso do ano. E ainda que muitos de nós concordemos ao ler idéias semelhantes a estas - e inclusive criticamos o uso que se faz da mulher na publicidade - no fim, caímos no mesmo jogo que nos é proposto e somos os primeiros a preocupar-nos com a passagem do tempo (e não precisamente porque nos aproximamos da morte).

Inquietam-nos os primeiros cabelos brancos ao cruzar o umbral dos 30, dos 40, dos 50 anos. No fundo também nós identificamos juventude e beleza, porque nossa bandeira estética também se reduz à margem do superficial e sensível. Onde está a luz do dia interior da qual fala o cego? Por que não a vemos?

Porque esta luz deve ser procurada com olhos interiores, em silêncio e na quietude que permite ver o invisível, que é realmente valioso.


BASTA SABER OLHAR BEM

O rosto de uma mulher que foi marcado por numerosas tormentas da vida pode ser belo. Seja qual for sua idade, a beleza de uma mulher que resistiu às dificuldades da vida brilha com um esplendor que se destaca, tal como ocorre com os vincos da madeira, cuja beleza tende a ser mais profunda com o passar dos anos. Há rostos de mulheres anciãs que irradiam algo que não se vende em nosso século: uma beleza pacífica, serena. Essa beleza cresce com o tempo, porque o tempo aquilata e purifica o que nos faz grandes: a capacidade de amar que possui o ser humano.

O passar silencioso e constante dos anos engrandece a mulher que viveu em ordem ao "dar-se" e não ao "buscar-se". Por isso, um rosto ancião pode ser atrativo. Talvez detrás de olhos compassivos se escondam muitas lágrimas; detrás de rugas maquiadas se oculta muita dor, porque o amor é doação, é buscar o bem objetivo do outro. Por isso, com freqüência, o amor dói. O amor não é uma maquiagem que se tira de noite; sua marca na pessoa é indelével e não se apaga com o passar do tempo.

Mais além dos sentimentos, da emotividade quase de origem física, esta capacidade oculta no ser humano lhe permite eleger livremente o que é difícil, doloroso e desinteressado, apenas para fazer alguém feliz.

A mulher, que por vocação está chamada a educar o homem na arte do amor desinteressado, é verdadeiramente bela quando é fiel a si mesma, ainda que seu cabelo faça reluzir a cor branca e suas mãos estejam trêmulas. Dizia Agostinho de Hipona: "apenas a beleza agrada". E se não é muita pretensão, podemos acrescentar: "apenas a beleza interior agrada sempre".

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